Eles eram crianças quando, em 1912, tropas do Exército e agentes
policiais desembarcaram nos sertões de Santa Catarina e Paraná para
combater seus pais, mães, tios e avós que pegaram em facões de pau e
velhas espadas farroupilhas e julianas, num movimento contra o projeto
de uma ferrovia em suas posses de terra e os desmandos de lideranças
emergentes da República, proclamada duas décadas antes.
Às vésperas do centenário da Guerra do Contestado, a maior rebelião
civil do País no século 20, que agitou o Sul entre os anos de 1912 e
1916, o Estado investigou o paradeiro das últimas testemunhas do
conflito que deixou um saldo estimado de dez mil mortos. Altino Bueno
da Silva, hoje com 108 anos, Maria Trindade Martins, 105, e Sebastiana
Medeiros, 102, foram localizados em porões de casas e barracos de
bairros pobres.
Numa investigação jornalística de 12 meses, para dar a versão dos
derrotados sobre os cem dias decisivos da vitoriosa campanha militar
(dezembro de 1914 a abril de 1915) comandada pelo general Fernando
Setembrino de Carvalho – o cerco, a tomada e a destruição do reduto
caboclo de Santa Maria, principal acampamento dos revoltosos, no atual
município catarinense de Timbó Grande, a 400 quilômetros de
Florianópolis.
A luta sertaneja marcou uma área de 30 mil quilômetros quadrados,
maior que Alagoas e o Haiti, ainda hoje uma região tratada como
“maldita” pelo Poder Público – as terras do Contestado, cercadas por
cidades colonizadas por europeus e com padrões de primeiro mundo,
apresentam índices de desenvolvimento humano equivalentes a rincões
pobres do Nordeste. É uma história de renegados em pleno Sul do Brasil.
Texto: Leonencio Nossa
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